Se Dina não for judia em “The Last of Us”, o que isso significa?
Muita gente comentou sobre o elenco da segunda temporada da série “The Last of Us”, principalmente sobre Kaitlyn Dever como Abby Anderson. Faz sentido, Abby é uma personagem nova importantíssima, e sua aparência física no jogo é diferente da série. Mas existe outra escolha de elenco super interessante (e potencialmente polêmica) que se afasta bastante da história do jogo: Isabela Merced como Dina.
À primeira vista, a escolha é ótima. Ambas têm tons de pele e cores de olhos parecidos, cabelos pretos e volumosos. Até o papel mais famoso de Merced (Alien: Romulus) envolve uma mulher grávida em um mundo violento. Mas há uma mudança crucial: a religião de Dina. No jogo, Dina é judia. Isabela Merced não é. E isso muda tudo.
“The Last of Us” e sua controversa história religiosa
Existem dois pontos delicados a serem considerados. Primeiro, “The Last of Us” tem uma relação, digamos, polêmica com o conflito entre Israel e Palestina. Neil Druckmann, o criador da série, cresceu em Israel e falou sobre como a violência que testemunhou lá, e a raiva que isso gerou, influenciou sua exploração da vingança em “The Last of Us Part 2”.
Houve comparações entre o WLF (colonos civilizados com uma sociedade moderna) e os Serapitas (nativos religiosos que não aceitam uma solução pacífica), remetendo a Israel e Palestina. Druckmann foi criticado por essa visão da geopolítica.
Com as tensões entre Israel e Palestina, imagino que a série da HBO irá evitar quaisquer alegorias para o conflito ao máximo. Talvez a religião de Dina tenha sido deixada de lado para evitar essa polêmica. Considerando que o jogo também gira em torno de salvar um garoto trans de uma sociedade que não o aceita (outro assunto sensível), “The Last of Us” precisa escolher suas batalhas.
O segundo ponto delicado é a escolha de Isabela Merced para o papel. Sabemos que ela não é judia, enquanto Dina no jogo é (assim como sua modelo, Cascina Caradonna). Merced foi discreta sobre sua religião, mas uma olhada rápida em seus antecedentes familiares mostra que ela foi criada como católica. Isso faz sentido, considerando que ela se considera peruana devido à família materna (embora tenha nascido em Cleveland) e o Peru é 80% católico.
Isso não significa que ela não possa interpretar uma judia, mas a decisão de escalar alguém que se assemelha esteticamente a Dina, mas tem uma etnia diferente, parece uma escolha deliberada para remodelar sua personagem.
A religião de Dina é crucial para “The Last of Us”
Se for esse o caso, é decepcionante por alguns motivos. A fé é um elemento pouco explorado em “The Last of Us”. Temos os Serapitas, uma nova religião sectária, mas “The Last of Us” não existe em um mundo tão distante do nosso. As pessoas ainda conhecem Pearl Jam e Jurassic Park. A religião teria sobrevivido. Em muitos casos, a tragédia só fortalece a fé. Embora seja um tema politicamente sensível, a natureza expansiva da série da HBO poderia ter dado mais tempo aos temas religiosos, enquanto essa escolha de elenco parece indicar que haverá menos.
Isso também significa remover uma das minhas cenas favoritas de “The Last of Us Part 2”, onde Ellie e Dina exploram a sinagoga. Era um prédio espetacular, e destacava a ideia de perseverança e sobrevivência um edifício que tinha durado décadas, embebido em milhares de anos de tradição humana. “The Last of Us” é uma experiência muito metafórica, mas não acho que nada seja tão sutil e poderoso quanto Dina andando pela sinagoga, sentindo todas as vidas que ela poderia ter vivido, e todas as vidas vividas antes dela, simultaneamente a pesando e a elevando.
Você poderia ter o mesmo tipo de cena com uma catedral católica se Dina fosse moldada ao passado de Merced, e como alguém criado na fé católica, essa cena poderia me atingir ainda mais. Mas a especificidade da identidade judaica de Dina não era apenas pessoal para Druckmann, mas também remetia a ideias de sofrimento, sobrevivência e peregrinação. Dina não é uma personagem religiosa em um edifício religioso; ela é especificamente uma mulher judia em uma sinagoga, com tudo o que isso representa.
Dina é uma das minhas personagens favoritas em “The Last of Us Part 2”. Seu relacionamento com Ellie é fundamental para o que torna a narrativa do jogo tão comovente, e Merced é uma ótima jovem atriz que já mostrou muita versatilidade. Ainda há coisas que me entusiasmam para a segunda temporada de “The Last of Us”, mas mudar Dina é perder Dina, e estou curioso para ver como sua personagem se desenvolve na televisão.
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Fonte: The Gamer